Nascida em Jerusalém, Muzian sempre se viu como uma refugiada. Casou em 1955 em Duraa, na região dos montes do Sul de Hebron e mudou-se para Jerusalém para viver em Mu’askar, um campo construído para os refugiados de 1948, no que é hoje o bairro judeu da cidade antiga. Aqui teve oito filhos mas apenas cinco sobreviveram. 

Devido à degradação das condições neste campo, as autoridades responsáveis pelo local promoveram a deslocação para o novo campo de Shu’fat. Enquanto a maioria das pessoas de Mu’askar se mudaram entre 1965 e 1966, Muzian, o marido e os cinco filhos permaneceram no campo. Em Julho de 1967, após a Guerra dos Seis Dias, foram então obrigados a ir para Shu’fat, com apenas aquilo que podiam levar nas mãos. 

Quando chegaram ao campo, onde apenas alguns edifícios tinham sido construídos no meio de montanhas de lixo, diversas tendas estavam a ser instaladas todos os dias. Eram extremamente pobres. Apesar da ajuda atribuída pelas Nações Unidas, as suas condições eram extremamente adversas. Inicialmente, o campo estava preparado para albergar cerca de 500 famílias. A família de sete pessoas foi colocada juntamente com outras seis num quarto de 13 por 7 metros e teve de partilhar as instalações sanitárias com os seus vizinhos. 
 

Perderam tudo. No entanto, o marido, com o pouco dinheiro que lhe tinha sido emprestado pela família, abriu uma pequena loja e os filhos, depois da escola, trabalhavam na padaria do irmão de Muzian na cidade antiga. Depois de se instalarem no local, teve mais seis filhos.  

Com o passar do tempo, a pequena loja tornou-se num minimercado bem conhecido e o marido construiu uma casa maior, mesmo do outro lado da rua onde era a primeira pequena habitação. Os filhos cresceram, começaram a casar e alguns conseguiram sair do país. 

Depois de 52 anos como refugiada, a viver nas ruas estreitas de Shu’fat, hoje Muzian já não consegue andar mas está rodeada pela família. Metade dos filhos continua a viver com ela em Shu’fat. Um deles, Jihad Abu Znaid, é o director da organização local Woman’s Center, parceira da Médicos do Mundo (MdM). Como matriarca de três gerações, Muzian tem um total de 125 descendentes. Apesar de alguns se terem mudado, todos continuam registrados como refugiados palestinianos.  

Actualmente, de acordo com dados da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina – conhecida pela sigla em inglês UNRWA -, existe 1,5 milhões de refugiados distribuídos por 85 campos e o de Shu’fat alberga aproximadamente 24 mil pessoas, incluindo 12 mil refugiados registrados. Apesar de ter sido ilegalmente anexado, juntamente com o resto de Jerusalém Oriental, as autoridades israelitas construíram um muro de separação em 2003, impedindo o acesso dos residentes do campo ao outro lado da cidade. 

Entre outros locais, a MdM trabalha no campo de refugiados de Shu’fat, disponibilizando protecção, cuidados de saúde mental e apoio psicossocial às crianças e jovens adultos ex-detidos, assim como às suas famílias. No contexto de uma abordagem holística, e em colaboração com parceiros locais, o objectivo é facilitar a sua inserção no meio escolar, melhorar a coesão familiar e aumentar a sensibilização sobre a detenção e suas consequências.