A hepatite é uma inflamação do fígado que, muitas vezes, passa despercebida. Pode não dar sinais durante anos, mas quando o faz, pode já ter causado danos sérios. A boa notícia? A hepatite é, na maioria dos casos, prevenível, tratável e até curável.

O que é a hepatite viral?

Existem vários tipos de hepatite viral — A, B, C, D e E — e cada uma tem as suas particularidades. Algumas transmitem-se por água ou alimentos contaminados, outras por contacto com sangue ou fluidos corporais. Algumas desaparecem por si, outras podem tornar-se crónicas e evoluir para doenças graves como cirrose ou cancro do fígado.
O que têm em comum? Todas podem ser combatidas com informação, prevenção e acesso a cuidados de saúde.

 

Porque é que é uma ameaça silenciosa?

A maioria das pessoas com hepatite não sabe que está infetada. Os sintomas podem demorar anos a surgir. E quando surgem, muitas vezes já há complicações. Por isso, o rastreio é essencial, sobretudo em populações mais vulneráveis ou com fatores de risco.

 

Como se previne?
  • Vacinação (para hepatite A e B);
  • Uso de preservativo e práticas seguras no consumo de drogas por via injetável;
  • Evitar partilha de objetos de higiene pessoal, como lâminas de barbear, escovas de dentes ou outros utensílios contaminados com sangue; 
  • Acesso a água potável e saneamento básico;
  • Rastreio regular e acesso a cuidados de saúde.

 

E o tratamento?

O tratamento da hepatite depende do tipo de vírus envolvido:

  • Hepatite A e E: geralmente não requerem tratamento específico. São infeções agudas, autolimitadas, e o organismo elimina o vírus por si. O foco está no descanso, hidratação e monitorização. A prevenção é essencial, sobretudo através de condições de higiene e saneamento e da toma da vacina contra a hepatite A.  
  • Hepatite B: tem cura e a vacinação é a principal forma de prevenção.
  • Hepatite C: é curável em mais de 95% dos casos com medicamentos antivirais de ação direta, geralmente tomados por via oral durante 8 a 12 semanas. O desafio está no diagnóstico precoce e no acesso ao tratamento.
  • Hepatite D: ocorre apenas em pessoas já infetadas com hepatite B. O tratamento é mais complexo, mas estão a surgir novas terapias promissoras.

Em todos os casos, o acesso ao diagnóstico, ao acompanhamento clínico e à informação é fundamental. E é aqui que entra o papel das organizações que trabalham no terreno, como a Médicos do Mundo.

 

Alguns sinais e sintomas de hepatite aguda

Quando presentes, devem motivar pedido de ajuda e rastreio:

  • febre
  • dor abdominal
  • fadiga
  • diminuição do apetite
  • náuseas
  • vómitos
  • icterícia (coloração amarelada da pele e dos olhos)
  • urina escura
  • fezes claras

No entanto, a inexistência de sintomas não é sinónimo de controlo da infeção. Habitualmente, uma hepatite crónica pode provocar complicações de evolução silenciosa, mas potencialmente graves.

 

Qual a situação em Portugal?

O mais recente relatório do Programa Nacional para as Hepatites Virais, apresentado pela Direção-Geral da Saúde no dia 25 de julho de 2025, revela uma evolução preocupante na incidência das hepatites virais em Portugal, com destaque para os seguintes dados:

  • Hepatite A: registaram-se 319 casos em 2024, um aumento significativo face aos 40 casos em 2023. Este crescimento está associado a surtos entre crianças e à transmissão sexual. O número acumulado desde o início de 2024 até julho de 2025 é de 504 casos.
  • Hepatite B: verificou-se um aumento de 51%, com 271 casos confirmados em 2024.
  • Hepatite C: os casos subiram 144%, totalizando 572 notificações em 2024. Este número pode refletir atrasos na notificação, mas exige atenção reforçada.

A maioria dos casos ocorre em homens e em contextos de vulnerabilidade social, o que reforça a urgência de uma resposta centrada nas pessoas e nos seus direitos, com enfoque na promoção do diagnóstico precoce, vacinação e tratamento acessível e não estigmatizante.

O relatório também destaca avanços importantes:

  • Mais de 36.300 tratamentos para hepatite C foram realizados em Portugal, com taxas de cura superiores a 97%.
  • Na população reclusa, a taxa de cura chega aos 98%.
  • Registou-se uma redução de 40% no tempo de espera entre a autorização e o início do tratamento.
     
E no mundo?

Segundo a Organização Mundial da Saúde:

  • A hepatite viral mata 1,3 milhões de pessoas por ano — cerca de 3.500 por dia;
  • Há 6.000 novas infeções diárias;
  • A maioria das pessoas infetadas não sabe que está doente.

Estes números são evitáveis. Ignorar custa vidas. Informar, prevenir e tratar salva-as.

 

O papel da Médicos do Mundo

Na Médicos do Mundo, trabalhamos todos os dias com pessoas que enfrentam barreiras no acesso à saúde. Promovemos o rastreio, a vacinação, o encaminhamento e o acompanhamento de pessoas com hepatite, integrando esta resposta numa abordagem mais ampla de redução de riscos e minimização de danos, promoção da saúde e justiça social.

Como organização que atua junto das populações mais vulneráveis, sabemos que a hepatite não é apenas uma questão médica — é uma questão de equidade, dignidade e direitos humanos.

 

Fontes:

  • Direção-Geral da Saúde – Relatório do Programa Nacional para as Hepatites Virais 2025
  • Organização Mundial da Saúde – Global Hepatitis Report 2024
  • OMS – Hepatitis B Factsheet