Emanuele Siracusa

No dia em se celebra a liberdade, apelamos ao Governo e à população em geral, para que defendam o Serviço Nacional de Saúde, instrumento de garantia do direito à saúde por parte dos portugueses.

Pela Direcção da Médicos do Mundo   

Hoje, 25 de Abril de 2022, a Revolução dos Cravos faz 48 anos. 
Com ela chegaram a liberdade e a democracia ao nosso país. Das transformações que se seguiram, queremos destacar, para além de uma nova Constituição, a criação do Serviço Nacional de Saúde (SNS), instrumento de garantia do direito à saúde por parte dos portugueses, consignado no artigo 64 da nossa Constituição, ponto 3 “Para assegurar o direito à protecção da saúde, incumbe prioritariamente ao Estado: a) Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação;...”.

Com a liberdade e democracia, vieram a melhoria das condições de vida da população, uma melhor protecção social, a democratização da educação, que juntamente com a acção do SNS, levaram à evolução positiva e sustentada dos indicadores de saúde desde então até hoje.

Na perspectiva da Médicos do Mundo (MdM), o SNS tem constituído um obstáculo para todos aqueles que encaram a prestação de cuidados de saúde como uma actividade mercantil e que identificam no sector da saúde enormes possibilidades de negócio.

Ao longo destes anos de liberdade, tal como tem acontecido por todo o mundo, os grandes grupos financeiros, normalmente associados a grandes seguradoras, têm vindo a investir fortemente no sector, assumindo-se junto dos governos e da opinião pública como mais eficientes e efectivos. Dado o seu poder de influência, procuram e têm conseguido, orientar as políticas públicas e a legislação em seu benefício, normalmente com prejuízo dos serviços públicos de saúde, neste caso do SNS, que pretendem limitado nas suas capacidades e reduzido ao papel de canal directo entre o Orçamento de Estado e as suas contas bancárias, por onde circulam as verbas destinadas à Saúde.

A MdM orienta a sua actividade e a análise da realidade nos países em que trabalha, pela forma como o direito à saúde, para nós fundamental, é assegurado. No nosso país não temos dúvidas que garantir o direito à saúde é indissociável da defesa e fortalecimento do SNS e na procura da cobertura universal em saúde, tal como é definida pela OMS, cujo conceito também é adoptado pelo nosso país.

No nosso entender, enquanto organização privada, toda a iniciativa privada, com ou sem fins lucrativos, tem o seu lugar no nosso país, cabendo ao Governo, um papel de planeamento, coordenação e regulação do sistema de saúde do país (sectores público, privado e social). É em torno do SNS que deverá ser organizado todo o sistema.

Assim sendo, neste dia em que comemoramos a liberdade, apelamos ao Governo e à população em geral, para que defendam o SNS.
Entendemos como prioritários:
i) o planeamento central, regional e local de todos os sectores envolvidos, o que implica o reforço da componente de saúde pública, quer em termos de orientação do sistema quer em meios,
ii) o reforço da capacidade dos Cuidados de Saúde Primários sem uma linha da frente eficaz e eficiente os hospitais continuarão a ser asfixiados,
iii) utilizar de forma extensiva e integrada as tecnologias de informação,
iv) ensaiar a todos os níveis novas formas de organização e gestão,
v) prepararmos o sistema para enfrentar os novos desafios (novas epidemias, aumento da esperança média de vida, alterações climáticas), e
vi) valorizar os profissionais de saúde, pois é com estes que se defende, robustece e desenvolve o SNS.  

Trata-se, pois, mais do que injectar dinheiro no sistema para novas instalações e equipamentos que fazem capas de jornais, mas que depois funcionam mal por deficiências organizativas e gestionárias e por falta de meios, nomeadamente humanos, deficits de gestão. Nesta área, são prioridades promover a exclusividade, melhorar os salários, condições de trabalho e as carreiras, de forma a evitar a fuga dos profissionais para o sector privado ou para a emigração, conforme se tem verificado nos últimos anos. Sem profissionais satisfeitos e motivados, o SNS não terá futuro e tornar-se-á numa caricatura do que deve ser. Será apenas um recurso para os mais pobres.  

 

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