Aqui no Porto, os idosos são apoiados pela Médicos do Mundo, que combate o seu isolamento e exclusão social e promove a equidade no acesso aos cuidados de saúde. Com o apoio do Projecto Terceira (C)Idade, os idosos veem as suas casas readaptadas às suas necessidades, através de ajudas técnicas que asseguram a sua qualidade de vida. Neste projecto desenvolvem-se ainda várias actividades com fins terapêuticos, na qual a Terapia Ocupacional assume um papel muito importante.

 

“O grande desafio do projecto é, de facto, conseguir criar domicílios funcionais, não só através da introdução de ajudas técnicas/ produtos de apoio, mas também das alterações/ adaptações domiciliárias, para que os seniores permaneçam neles o maior tempo possível e com qualidade.” – refere Sara Moura, terapeuta ocupacional da Médicos do Mundo.

Para conhecer melhor o Terceira (C)Idade, Sara Moura fala-nos sobre a importância do projecto, os objectivos e os principais impactos na vida da população apoiada.

Médicos do Mundo (MdM): A Médicos do Mundo desenvolve projectos que visam melhorar as condições de vida dos beneficiários e atenuar os impactos da exclusão social, nomeadamente, a falta de acesso a cuidados básicos de saúde. Qual o contributo do Projecto Terceira (c)Idade na vida das pessoas idosas?

Sara Moura (SM): O Projecto Terceira (C)Idade, da Médicos do Mundo, visa uma intervenção de proximidade com a população sénior do Porto, com o intuito de combater o isolamento social, promover a equidade no acesso aos cuidados de saúde, fomentar a formação e capacitação de cuidadores, readaptar os contextos domiciliários e reabilitar a própria pessoa face à sua condição actual, de modo a retardar a institucionalização precoce.

MdM: A Terapia Ocupacional é uma vertente muito importante deste projecto. Quais os impactos na vida dos beneficiários?

SM: Cada pessoa é um ser único, e por isso o olhar da Terapia Ocupacional é absolutamente personalizado, específico e dirigido. A Terapia Ocupacional é uma profissão da área da saúde que usa a ocupação como meio terapêutico, de forma a promover a saúde, o bem-estar e a qualidade de vida. E entende-se por «ocupação» tudo o que a pessoa realiza com o intuito de cuidar de si própria, desfrutar da vida e/ou contribuir para o desenvolvimento da sua comunidade.

Enquanto terapeuta ocupacional no Projecto TCI procuro estimular os seniores para que continuem a desempenhar as suas actividades do dia-a-dia da forma mais autónoma e independente possível; sejam capazes de percepcionar os factores de risco de queda e adoptem as melhores estratégias e ferramentas para os eliminar e que possam ser agentes activos e promotores da mudança. 

 

MdM: Quais os principais desafios do Projecto Terceira (C)Idade?

SM: O grande desafio do projecto é, de facto, conseguir criar domicílios funcionais, não só através da introdução de ajudas técnicas/ produtos de apoio, mas também das alterações/ adaptações domiciliárias, para que os seniores permaneçam neles o maior tempo possível e com qualidade. Constatamos que este tipo de intervenção assume-se como uma mais-valia no processo de envelhecer e de cuidar, razão pela qual deveria ser uma aposta, principalmente no que diz respeito a equipas comunitárias, que intervêm no contexto real onde as pessoas mais velhas estão inseridas.

No âmbito da nossa intervenção pudemos depreender que principalmente a Zona Histórica do Porto, pela sua especificidade geográfica e arquitetónica e caraterísticas dos edifícios, oferece grandes obstáculos à mobilidade, autonomia e independência e participação da população mais envelhecida, constituindo factores de isolamento, solidão e, até mesmo, exclusão social. Estas barreiras associadas à resiliência e resistência à mudança demonstrada pelos idosos, os quais apresentam hábitos e rotinas bastante enraizados, constituiu um forte entrave ao longo do processo de intervenção. Contudo, temos a convicção de que é através de um trabalho árduo de proximidade junto da população, reforçada na relação terapêutica, empática e de confiança estabelecida entre a equipa e os utentes, que favorecemos e estreitamos os laços, algo essencial à mudança comportamental.

 

MdM: A Médicos do Mundo trabalha em parceria com outras entidades, de forma a garantir as melhores respostas às sinalizações. Que rede é esta e como é que funciona?

SM: Da nossa experiência no terreno, acreditamos que a rede de parceiros e a articulação interinstitucional é fundamental para que consigamos uma resposta mais efectiva e eficaz nas mais diversas situações.

A meu ver, o trabalho em rede engloba a criação de sinergias, a união de esforços e a partilha de recursos, o que torna a intervenção privilegiada/ facilitada, pois permite chegar a quem realmente precisa de nós. E aqui falamos dos serviços de saúde, das respostas da rede social de suporte, de instituições de voluntariado para seniores, das autarquias e das associações que trabalham no âmbito do envelhecimento.

Só assim, conseguimos de facto promover o envelhecimento activo, melhorar o bem-estar e a qualidade de vida dos nossos utentes e, simultaneamente, combater o idadismo, dotando a comunidade de um novo olhar sobre o sénior.

 

MdM: Quais são as necessidades emergentes para que o projecto Terceira (C)Idade continue aqui?

SM: O Projecto TCI assume-se como um complemento das respostas que existem para a população sénior. Apercebermo-nos de que as estruturas da rede social, nomeadamente, lares, centros de dia e serviços de apoio domiciliários para além de sobrelotados, não constituem respostas suficientes face aos diagnósticos, pelo que se torna fundamental a intervenção comunitária e de proximidade.

Acreditamos que os contextos onde os seniores estão inseridos exercem um forte impacto no seu desempenho no dia-a-dia, daí a importância de estarem adaptados às suas reais capacidades e dificuldades para viabilizarem a participação e, consequentemente, não a condicionarem.

Urge, portanto, a necessidade da adaptação do ambiente, que pressupõe a prevenção do risco de queda e/ ou de outros acidentes, a eliminação de barreiras arquitetónicas, a adopção de práticas de acessibilidade e a utilização de produtos de apoio e/ou novas tecnologias que favoreçam a segurança, o bem-estar, a protecção e potenciem ao máximo a participação e o desempenho dos beneficiários e seus cuidadores, para além de permitirem identificar a não adesão a regime terapêutico, os sinais de alerta de processo demencial, e outras situações de fragilidade e vulnerabilidade.

Acredito que é urgente dar continuidade a este tipo de equipas, através de financiamentos, donativos e apoios no âmbito da responsabilidade social, pois são elas que chegam verdadeiramente às pessoas, que conhecem as suas realidades e que actuam de uma forma concertada para melhorar significativamente as suas vidas.

Ajude-nos a continuar Aqui. Os idosos do Porto precisam de si.